Mães que vestem a camisa

Mães que vestem a camisa

30/04/2024 30/04/24

Mães torcedoras são muito mais do que isso. São mães que investem tempo na formação da vida de seus filhos, algo que vai muito além do interesse pelo esporte apenas. E pouco importa se o filho ou a filha está começando a entrar em campo ou está a caminho das Olimpíadas de Paris — uma mãe na arquibancada faz toda a diferença. 

Se toda mãe sofre — por ter zelo permanente, preocupação excessiva ou ansiedade em relação ao futuro —, as mães de atletas sofrem em dobro. Pelo menos, essa é a impressão que se tem ao vê-las, sozinhas ou em grupo, segurando as grades do Campo de Futebol, reclinadas para a frente nas arquibancadas da piscina
ou, a cada rally, se levantando do banco ao lado da quadra de Tênis.

Essas mulheres, que vestem a camisa do time das suas crianças com amor maternal, acompanham o jogo como um todo, claro, mas sempre com um olhar direcionado ao desempenho de um dos esportistas em especial — seu filho ou sua filha. E sabem que precisam dosar a torcida: nem de menos, para não desestimular; nem de mais, para não pressionar.

Mães que encontram espaço em suas agendas lotadas para acompanhar de perto a formação dos filhos estão com frequência no Clube. Isso é um privilégio, opina Maria Cristina Machado de Araújo, diretora de Esportes Associativos do Pinheiros. “O esporte ensina mais do que ser um campeão”, diz ela. “Ele dá lições de vida.”

Maria Cristina fala com conhecimento de causa. Ela é mãe, e por anos fez a mesma jornada. “Poder estar presente apoiando e orientando, acolhendo nos momentos ruins e celebrando nos bons, é maravilhoso. Forma-se um laço forte entre mãe e filho.”

Thais Basile Antonaccio e a filha Luiza

É o caso da empresária e ex-nadadora Thais Basile Antonaccio, mãe da Luiza, de 9 anos, ambas associadas do Pinheiros desde a primeira infância. Thais foi atleta da Natação do Clube até os 19 anos. Hoje, equilibra o trabalho e a rotina esportiva da filha, que compete desde o ano passado nos circuitos mirins da Natação.

É uma jornada intensa, de ao menos uma hora e meia de treino da filha por dia, cinco vezes por semana. Fora o tempo gasto com o deslocamento. Para dar conta disso tudo é preciso ter organização: “Sou metódica, faço tudo com agenda e tento agilizar ao máximo meu trabalho no período da manhã”.

Isabel Zurita com a filha, Maria

Isabel Zurita, empresária, relata uma rotina semelhante. Ela se desdobra para acompanhar a filha, Maria, de 10 anos, nos treinos de Futebol. “A maior dificuldade é encaixar tudo isso na rotina. Mas o ganho é claro, ela fica muito feliz quando venho assistir.” E tem também o filho Joaquim, de 12 anos, que, além de Futebol, também joga Handebol.

Priscila Oliver com o filho Martin

Outra representante do time das mães que acompanham a formação dos filhos no Pinheiros é Priscila Oliver, professora, mãe da Alice, de 11 anos e do Martin, 13. O garoto pratica Atletismo e Squash, enquanto a menina compete em sua categoria nos Saltos Ornamentais (ela é a atual campeã paulista na plataforma e no trampolim, e integra a equipe do Clube que disputará o Campeonato Brasileiro).

“A gente fica no Clube umas cinco horas por dia. E às vezes tem treino no sábado, competição de domingo, e estamos aqui”, diz Priscila. “Eu trabalho meio período, foi uma escolha que fiz justamente para poder ficar com eles. Meu marido também acompanha bastante. A presença da família é importante, pois o esporte traz desafios e, às vezes, eles sentem ansiedade ou angústia. Estando por perto, a gente consegue ajudar. Nada como um colo de mãe.”

A gestão do tempo é mesmo a maior dificuldade, concorda Márcia Martins, psicóloga do esporte do Departamento de Psicologia do ECP. “É todo um combinado para levar na escola, buscar, deixar no treino. O que a prática do esporte oferece é disciplina, comprometimento. É uma organização que demanda de todos. Um filho que faz esporte muda a rotina da casa inteira.”

Depois de ouvir muitos relatos, Márcia adverte as mães que evitem se projetar na vida dos filhos. “Se fui atleta, tenho que ter o cuidado de não projetar no meu filho as minhas expectativas. O exercício de se questionar o quanto estou ajudando ou atrapalhando deve ser constante. E posso perguntar isso diretamente à criança.”

A iniciativa de ouvir a criança, na opinião de Márcia, deve incluir a questão da presença dos pais nas atividades esportivas. “Tenho duas filhas e, no começo, uma delas não queria que eu fosse aos treinos. Eu me tranquilizava ouvindo a professora, e ia comer um lanche. O importante é que, mesmo ela não querendo que eu fosse, segui dando todo o apoio para ela treinar, e sem deixá-la desacompanhada.”

Ex-atleta, Thais endossa a percepção de que a disposição para acompanhar de perto os filhos precisa vir acompanhada de reflexão. “Na agenda da Lu, faço de tudo para que ela continue sendo criança. Tento ser aquela mãe que não coloca pressão. Quero ser torcedora, e não ex-nadadora”, diz. “Ver a Luiza crescer é muito legal. Cada dia é uma descoberta, tanto para ela quanto para mim. Acredito que o esporte ajuda na construção da pessoa dela.”

Já para Cristina Baumgart, a palavra-chave é integração. Associada “de uma vida inteira”, ela concilia a carreira como consultora de famílias empresárias e a maternidade da Julia, de 17 anos, que tem síndrome de Landau-Kleffner e uma alteração genética que a colocam no espectro autista. Cristina tem dois filhos mais velhos e os acompanhou nos esportes. “Mas com a Julia esse processo foi e é de uma cor diferente”, diz. A garota passou a fazer atividades de forma mais recorrente no Clube neste ano, quando começou no PIP, o Projeto Inclusão Pinheiros.

As motivações foram o incentivo à saúde física e mental e a integração das “crianças atípicas”, como Cristina se refere àquelas com condições como Síndrome de Down e autismo. “Quando a gente consegue juntar os típicos e os atípicos, vê os resultados”, diz. No caso de Julia, os resultados incluem aumento de musculatura, fôlego e resistência. Ela vai ao Clube todos os dias e faz as atividades do PIP de segunda à sexta. O cardápio é variado: Atletismo, Natação e as aulas de Tênis, que tiram elogios rasgados de Cristina. E ainda tem o teatro. E ainda mais: o Boliche, uma vez por mês.

Maria Claudia Calmon Martins e o filho Luiz Guilherme, o Guiga

Maria Claudia Calmon Martins, economista, mãe do Luiz Guilherme, de 28 anos, também exalta o PIP. Portador da Síndrome de Down, ele é associado do Pinheiros desde pequeno. Sua trajetória no esporte começou no CAD e depois passou a incluir outras modalidades, como Natação, Handebol, Remo, Esgrima e Tênis.

Acompanhar essa descoberta demandou e ainda demanda versatilidade e resiliência, afirma a mãe. “Em termos de inclusão, as atividades do PIP têm sido importantíssimas. Para eles, é onde começam a se encontrar com outras pessoas e ter amigos. Hoje, o Guiga tem uma turma.”

MÃE NAS OLIMPÍADAS

O papel das mães é fundamental na vida dos esportistas, sejam eles amadores ou atletas de alto rendimento

Marlise e a filha, Djenyfer, triatleta pinheirense classificada para Paris

Aos 31 anos e rumo às Olimpíadas de Paris, Djenyfer Arnold coloca sua mãe, Marlise, no pódio. Uma das atletas do Pinheiros classificadas para representar o Brasil na França, ela não tem dúvidas do impacto da presença da mãe na sua carreira e personalidade. “Ela fez toda a diferença. Entrei tarde no Triatlo, e mesmo assim ela comprou a ideia e me fez sentir amparada e segura.”

Para a triatleta, por trás do desempenho notável de cada esportista de alto rendimento existe uma trajetória de cuidado, formação e sacrifício. “Tive momentos que não foram bons, como todo atleta, e ter minha mãe ao meu lado foi essencial para seguir firme em busca da vaga olímpica”, diz Djenyfer.

Acompanhar a formação dela foi tarefa árdua, conta Marlise, hoje professora aposentada. “Djenyfer começou na Natação, e, como eu trabalhava o dia todo, era o irmão quem a olhava. Iam de transporte coletivo. Logo ela se destacou e iniciou as competições. Nós a levávamos em todas as provas possíveis, e, quando eu não podia acompanhar, ficava com o coração na
mão”, revela.

A saudade apertou, ela lembra, quando a família permitiu que a jovem, então com 13 anos, deixasse São Bento do Sul, cidadezinha do interior de Santa Catarina, para morar e treinar na distante capital do estado, Florianópolis. Mais tarde, quando terminou a faculdade, veio outro momento difícil. “Pela falta de incentivo do Estado, a bolsa-atleta sempre atrasava, e disse a ela que deveria pensar em voltar para prestar concurso e dar aula aqui. Percebi que ela ficou frustrada”, diz a mãe.

Marlise recorda que, na época, uma professora convidou a filha para conhecer o Triatlo. Logo veio o convite de seu atual técnico, Marcelo Ortiz, para treinar no Pinheiros. “No início questionamos, porque não tínhamos conhecimento sobre o esporte. Mas apoiamos, e ela foi aprender com 24 anos. Foi muito gratificante ver a alegria dela em cada conquista, todos os sonhos que ela tinha na Natação estão acontecendo no Triatlo.”

A distância cresceu, e o orgulho, também. “Neste ano, o foco é a Olimpíada. Nem acredito que isso é quase realidade, estou tão ansiosa que me emociono.”

Mas a medalha mais almejada pelas mães, sobretudo neste mês em que se comemora o Dia das Mães, não é de ouro, prata ou bronze — ela é feita de amor, carinho e dedicação.

Djenyfer (ao centro) com os pais Sérgio e Marlise em 2005

FOTOS: MARCELO PRAIS

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