Mindfulness, o antídoto à distração

Mindfulness, o antídoto à distração

Prática ensina a ganhar atenção e viver o tempo presente

29/08/2025 29/08/25

m 1977, quando Gilberto Gil gravou “Aqui e Agora”, composição do disco Refavela, o professor norte-americano John Kabat-Zinn dava os primeiros contornos à prática meditativa que hoje é conhecida como mindfulness.Embora seja praticante de meditação, não há notícia de que Gil àquela época conhecesse o trabalho de Kabat-Zinn. Mesmo assim, o verso inicial de “Aqui e Agora” — “O melhor lugar do mundo é aqui e agora” — é a síntese perfeita do objetivo do mindfulness: um treinamento que ensina a perceber onde está a nossa atenção, reconhecer quando ela se dispersa e redirecioná-la de forma consciente para o presente e para o que importa.

“É como ajustar o GPS mental para focar no que está acontecendo de relevante no momento: seja a respiração, uma emoção, uma conversa ou uma decisão difícil. É um treino de lucidez, não um esforço de controle”, diz o médico e instrutor de mindfulness Marcelo Demarzo, pioneiro da prática no Brasil.

Em um cotidiano recheado de estímulos como o nosso, a atenção se tornou um bem escasso e, portanto, valioso. Isso explica o motivo pelo qual o mindfulnesss, vem se popularizando. A prática permite desenvolver o que os especialistas chamam de inteligência atencional, ou escolher com consciência onde se quer colocar a atenção e a energia.

Além da enxurrada de distrações do dia a dia, a tendência natural da mente é não se fixar em um tema ou assunto, mas passear por eles. “A gente costuma usar a imagem de que o cérebro é um macaco bêbado picado por um escorpião. Fica pulando de galho em galho o tempo todo”, compara a empresária e instrutora de mindfulness Fernanda Prando Godoy. Como reflexo dessa atividade cerebral frenética, pesquisas indicam que hoje ficamos distraídos em quase metade do tempo que passamos despertos.

A prática do mindfulness, segundo Fernanda, ensina a observar o macaco e a domá-
-lo. Em outras palavras, notar as divagações naturais da mente e escolher, voluntariamente, trazer a atenção de volta. “Não é sobre parar de pensar. É sobre parar de ser arrastado por cada pensamento ou distração mental”, diz Demarzo.

A prática do mindfulness, como dito, se utiliza da meditação. Mas, diferentemente das técnicas tradicionais, que recorrem à repetição de mantras ou a visualizações complexas com o objetivo de esvaziar a mente ou atingir estados alterados de consciência, a intenção é treinar a mente para perceber, de forma consciente, a respiração, o corpo, os pensamentos.

Nas práticas, Fernanda utiliza com seus alunos o que chama de escaneamento corporal: pede para que coloquem atenção numa parte específica do corpo e prestem atenção às sensações que envolvem a região. “A sensação física acontece no momento presente. É uma âncora que ajuda a pessoa a se conectar com o aqui e agora”, diz. Com o tempo e o correr da prática, o aluno vai aprendendo a identificar sensações, pensamentos e as emoções despertados. “Ele vai construindo o que chamo de alfabeto emocional, vai entendendo como o seu pensamento funciona.” A ideia, tendo esse mapa pessoal claro, é ganhar qualidade nas ações, decisões e relações pessoais.

Demarzo destaca os seguintes benefícios que a prática de mindfulness proporciona:

• Melhoria da concentração e foco;
• Regulação e gestão emocional, com menos impulsividade e mais clareza nas decisões;
• Redução de estresse e ansiedade, com melhora do sono e da qualidade de vida;
• Fortalecimento da empatia e da escuta ativa, trazendo ganhos nas relações pessoais e profissionais.

Segundo o instrutor, existem mais de 20 mil estudos científicos que comprovam os efeitos do treinamento de mindfulness no cérebro, no corpo e no comportamento saudável. Ele cita, por exemplo, pesquisas neurocientíficas com ressonância magnética funcional mostrando que a prática regular de mindfulness altera positivamente estruturas cerebrais ligadas à atenção, à memória e à regulação emocional, como o córtex pré-frontal, o córtex cingulado anterior, a ínsula e a amígdala cerebral. E estudos clínicos que apontam benefícios para o controle do estresse, ansiedade, depressão, dor crônica e até prevenção de recaídas em quadros depressão. 

“mindfulness não é sobre parar o mundo, mas sobre aprender a estar mais inteiro dentro dele. Isso não exige nenhum talento especial. Só disposição e um pouco de disciplina para treinar a mente num mundo que vive distraído”, garante Demarzo.

Primeiros passos

Dicas para quem quer experimentar a prática do mindfulness

✅ Comece aos poucos. Três a cinco minutos por dia já fazem diferença. O importante é a constância e a regularidade, não a duração.

✅ Escolha um momento do dia. Reserve um horário para prática. Pode ser ao acordar, antes de dormir ou antes de uma reunião importante. A regularidade ajuda a criar o hábito.

✅ Use a respiração como âncora para treinar a atenção plena. Sente-se confortavelmente, feche os olhos e apenas observe sua respiração, sem tentar controlá-la. Quando perceber que se distraiu (e vai acontecer), apenas traga a atenção de volta, com gentileza, sem brigar consigo mesmo.

✅ Seja paciente. A mente divaga. É o que ela faz. O treino consiste em trazer a mente para onde o corpo está, criando inteligência atencional. O treinamento de mindfulness não tem como objetivo proporcionar um estado de plenitude. A ideia é ganhar foco, ser menos reativo e ter clareza mental diante das atribulações da vida.

✅ Procure apoio qualificado de um instrutor certificado. Especialmente para iniciantes, participar de um curso com instrutores certificados e experientes ajuda a compreender e incorporar o treinamento com mais profundidade e segurança.

                                                                                               

Radar