O ex-sedentário Nizan Guanaes conta como a dedicação ao esporte tem o poder de transformar uma vida, e o que o Clube tem a ver com essa guinada
Publicitário superpremiado, Nizan Guanaes já foi descrito como um dos cinco brasileiros mais influentes do mundo — palavra do Financial Times. Hoje, aos 65 anos, seu prestígio segue inabalado, mas talvez ele fosse mais bem descrito como um garimpeiro da própria felicidade.
A trajetória de êxitos profissionais é longa. Nizan cofundou o Grupo ABC e é fundador e CEO da N Ideas, empresa de estratégia que atende a algumas das principais empresas do País, apenas para citar dois destaques de seu currículo. Mas hoje aprendeu a valorizar igualmente a vida pessoal.
Ex-gordo e ex-sedentário, Nizan deixou para trás os 150 quilos dos tempos pré-bariátrica para se tornar maratonista dedicado. A busca do equilíbrio entre a saúde mental e física foi o caminho que encontrou para conquistar a felicidade — e o Pinheiros tem muito a ver com essa guinada.
O Clube foi o lugar que ele elegeu para seus treinos diários. Soteropolitano, Nizan tinha nas praias de Salvador o cenário ideal para a vida em contato com a natureza. Em São Paulo, fez do Pinheiros a sua praia.
Parte dessa história está narrada em Você aguenta ser feliz?, livro que publicou em 2022 em parceria com o psiquiatra Arthur Guerra, que o acompanhou na mudança radical. “Ele me pegou um quase alcoólatra e me transformou em um quase atleta”, escreve o publicitário.
O título do livro remete a uma pergunta instigante que Guerra lhe fez durante o tratamento. A obra, que frequentou a lista dos mais vendidos, está disponível para empréstimo na Biblioteca do Clube.
Em março, pouco antes de embarcar para Nova York, para a festa de casamento de seu filho, Nizan Guanaes abriu espaço em sua agenda para falar com a revista Pinheiros.
Pinheiros Como está sua corrida atrás da felicidade? Já está vendo a linha de chegada? Aliás, existe linha de chegada?
Nizan – A felicidade não tem linha de chegada. É que nem bicicleta, se você parar de pedalar você cai. O importante não é a linha de chegada, é a rota. É o que a gente vive. A linha de chegada é todo o dia. E depois você começa outro dia.
Pinheiros – No livro Você aguenta ser feliz?, você descreve a maratona como um diálogo de 42 quilômetros entre o desistir e o seguir. Na reta final, o que te faz seguir, que pensamentos passam por sua cabeça?
Nizan – A partir do quilômetro 35 eu foco em não pensar, e só seguir em frente. Nessa altura tudo dói. Mas é só lembrar que o prazer da chegada é tão imenso que você esquece toda a dor. Isso vale para todos que se esforçam, seja o nadador, o jogador, o lutador, até o empreendedor. Não é à toa que todos têm “dor” no próprio nome. A gente tem que entender que a dor é inevitável, ela faz parte da conquista.
Pinheiros – No livro, você e Arthur Guerra citam um heterônimo de Fernando Pessoa, que diz “Arre, estou farto de semideuses”. O verso pode ser lido como uma autocrítica ao Nizan do passado?
Nizan – Não sei, acho que não. Pode ser uma autocrítica inconsciente, mas é muito mais uma crítica a quem acha que não tem problemas. Parece que vivemos numa sociedade em que ninguém tem depressão, ansiedade, problema de alcoolismo. Para admitir que a gente tem algum problema é preciso ter coragem. Todo mundo fala em vulnerabilidade, mas a verdade é que os praticantes são poucos.
Pinheiros – É verdade que você mudou de casa só para ficar mais perto do Clube?
Nizan – É verdade. Mudei de casa para ficar mais perto do Clube. Essa foi uma ideia do Arthur Guerra. Nem foi uma ideia original. Muita gente faz isso também. É por causa do Pinheiros que a procura por imóveis na rua Tucumã é tão grande.
Tem uns dois ou três anos que sou associado. O Pinheiros fez toda a diferença na minha vida. Dos clubes equivalentes de São Paulo, o Pinheiros é o que tem mais mistura de gente, por causa do esporte que é tão valorizado aqui. E isso é muito bom — o Pinheiros é a minha praia.
Estou viciado no Clube. Tenho bicicleta e esteira em casa, mas não é a mesma coisa. A energia de começar o dia no Clube é revigorante.
O Pinheiros e meu personal do Clube, Jorge Pacheco, me deram outro condicionamento.
Pinheiros – Por falar nisso, como é a sua rotina diária de exercícios físicos?
Nizan – Quando consigo ir de manhã bem cedinho — e quase sempre consigo — eu sinto que o dia é outro, tenho mais gás, mais disposição para tudo. Antes como uma fruta, só para não treinar com a barriga vazia. Faço aeróbica e musculação, e ainda quero, no futuro, fazer natação também. Quando estou com a agenda atrapalhada vou no fim do dia, mas a atividade física nesse horário é mais relaxante.
Pinheiros – A atividade física estimula a atividade intelectual?
Nizan – Sem dúvida. Muitas vezes é durante o treino que tenho as melhores ideias. Outras vezes me ocorre a solução para um problema. Mas também posso não pensar em nada. Só descanso a cabeça, longe do celular.
Pinheiros – A rotina de exercícios te deixou mais disciplinado? Rotina é prisão ou liberdade?
Nizan – A rotina liberta. Prisão é vício, compulsão. Eu vejo uma geração que acha que rotina e disciplina são coisas de gente careta. Não! Com disciplina você pode fazer tudo. Disciplina não significa acordar cedo. Eu, por exemplo, tenho um amigo muito disciplinado que só trabalha à noite. O nome dele é Caetano Veloso. Ele é superprodutivo, mas tem a lógica dele. Cada um tem que ter a sua própria disciplina.
Pinheiros – Concorda com o dalai-lama, que diz que a felicidade é genética ou treinada?
Nizan – Essa frase do dalai-lama me inspira muito. Vinte por cento das pessoas têm uma felicidade genética. Minha mulher é assim. Comigo não. Eu faço parte da maioria. Comigo a felicidade é suada. A mesma cabeça de onde saem boas ideias também fabrica pensamentos paranoicos, obsessivos. Então eu preciso correr atrás da minha felicidade. Donata recebeu isso de herança — eu não.
A OBRA
Autores Arthur Guerra e Nizan Guanaes
Editora Sextante (224 págs.)
FOTO: VICTOR AFFARO